O silêncio dos inocentes...

Hoje eu quero falar da dificuldade das mulheres/homens em pedir ajuda, essas pessoas não são fracas, a situação é que é devastadora, deixando-as presas, amaradas, sem reação, mesmo querendo fugir.

Quando comecei a fazer as perguntas sobre sexo no meu facebook, porque percebi que grande parte das pessoas não sabia falar assertivamente sobre o assunto, não tinham muitas informações, muita gente aprende fazendo e não se questionam se aquilo é o certo ou o errado, ou ainda se pode melhorar.

Eu já venho estudando por dois anos, lendo, vendo vídeos, discutindo com outras pessoas. Alguns aceitaram bem os questionamentos, outros não, isso não me incomoda, nem Jesus agradou a todos, quem sou eu para agradar né.

E passar pela situação imagino eu que 10% dos que a gente mais tem ouvido e visto falar nas redes sociais e na televisão. Foi a pior das situações.

Eu me senti um trapo velho, uma tristeza gigante, não tinha reação, parecia que o corpo não respondia aos movimentos que eu queria fazer. Era a sensação mais esquisita que eu estava sentindo como nunca antes.

Era uma mistura de medo, sensação de perdida no meio do oceano sem saber nadar, uma impotência e pânico, “alguém sempre vai te perseguir, custe o que o custar, você fica em pânico por não saber como fugir”.

Eu acordei na manhã de sábado, fiz algumas coisas e fui ver o celular, e em uns comentários de uma pergunta, estava lá, alguém me ofendendo gratuitamente, palavras horríveis sobre a minha pessoa, xingamentos, injúrias!

Mesmo eu fazendo a confrontação comigo mesma, mesmo sabendo que tudo aquilo era calúnia, inverdades, me feriu profundamente.

Não sou perfeita, e não tenho nenhuma vontade de buscar essa perfeição que não existe, tenho defeitos como todo mundo, tenho muito pra evoluir, melhorar e aprender.

A ideia foi ajudar as pessoas a falar sobre o assunto, buscar entendimento e melhorar a vida, sexo ainda é um tabu e muitos relacionamentos podem melhorar. Como lá no início, que eu ouvia muito, “essa mensagem reflexão que você enviou hoje era tudo o que eu precisava ler, obrigada”.


Quando uma pessoa agride uma mulher/homem verbalmente, e isso não é menos pior que agressão física, essa pessoa fere coisas dentro da gente a ponto de não sabermos pra onde correr, que atitude tomar, pra quem gritar socorro e pedir ajuda.

Eu me senti apática, paralisada diante das coisas e via as horas passando por mim, como se o tempo fosse rápido demais e eu não conseguia alcançar nada e ninguém.

Falando principalmente das Mulheres, como somos vulneráveis, só por ser mulher, por ser menor e ter menor força. As mulheres tem medo de ser mulher, por sair na rua sozinha, vivem apavoradas, sentem mede de ser abusadas por estranhos ou pessoas próximas, isso é mais comum do que podemos imaginar... Muitas vezes o outro usa força, gritos intimidadores.

Tornamos-nos reféns, reféns do medo, de histórias, de situações, algumas vezes de relacionamentos tóxicos, porque no fundo não conseguirmos sair, não porque somos fracos, covardes, ou até dizem nas piadinhas, “gostamos de apanhar e sofrer”, não, ninguém gosta de sofrer, ninguém curte apanhar infinitamente.

A situação é tão anestesiante e paralisante que não temos como reagir pra sair dessa, a sensação de estar sozinhos é real, muitas vezes sem apoio de amigos, familiares e afins.

Às vezes a gente espera que pessoas próximas ajudem-nos, dê abraços, mãos, carinho e força pra ir lá e enfrentar. Mas isso geralmente não acontece.

Depois de passar o fim de semana, anestesiada sem saber o que fazer, conversei com algumas pessoas, algumas ajudaram com informações, o que fazer, e outras fingiram não ver, é mais fácil lidar com o que a gente não vê né, e outras acharam tudo aquilo uma bobeira.

Acordei na segunda-feira não tão disposta a seguir em frente, eu não sei como descrever essa sensação, ser xingada por alguém gratuitamente, sem nada ter feito, sem ter culpa no cartório.

Mas fui lá, como orientações de algumas pessoas, fui até a delegacia, e eu que achava que hospital era um ambiente ruim, nunca curti hospital, desde criança tive várias crises de pneumonia, ainda lembro quando era bem pequena, que não tinha leito pra eu tomar o soro. Mas ainda pior do que precisar de médico e ou medicação e não ter é entrar numa delegacia, sozinha, o ambiente é bem esquisito.

Logo de cara, você chega e expõe porque está ali, entra numa fila, pega a senha, que às vezes parece infinita e observa ao redor, passando ao lado, dois presos, algemados, um andando normal e o outro todo roxo, com o pé quebrado indo em direção a uma viatura.


Não é o ambiente favorável pra ninguém, o clima é pesado, o ar é estranho, o medo e o pânico estão por lá o tempo todo, essa é a minha descrição de estar lá. É a sensação de extremo vazio, solidão, eu acho que eu nunca vou conseguir explicar. Sozinha no mundo cheio de gente.

A orientação era fazer um boletim preventivo, mas o escrivão disse que não poderia ser somente isso, essa informação me gerou um terror mental, como poderia fazer um boletim normal, ele viria atrás de mim, perseguiria nos consultórios, armaria emboscadas, ou até faria chantagem para eu retirar a queixa, literalmente um filme de terror passou pela minha cabeça, muitos pensamentos automáticos pipocando sem parar.

Embora fossem pensamentos, era exatamente um filme de terror acontecendo ali na minha frente e eu no meio disso tudo.

Eu tinha vontade de chorar, de ser abraçada e acordar, eu só queria acordar, mesmo já estando acordada. Queria acreditar que ia abrir os olhos e seria só um pesadelo, mesmo sabendo que era só um pesadelo noturno. Por que isso está acontecendo comigo?

Era uma angustia no meu peito, um medo, eu não sabia o que aconteceria, não prever o que pode acontecer, eram pensamentos torturantes e sombrios, e a única certeza, será que posso ser protegida? Quem pode me defender? Estava me sentindo totalmente vulnerável. Exposta. Aterrorizada.

Continue conversando com algumas pessoas pelo celular e decidi então sair da delegacia, sem fazer o boletim. Num primeiro momento um alívio, dúvidas, será que não fazer é fraqueza, sou uma perdedora?

Estar numa delegacia não é algo comum, ou normal para quem não tem esse costume, fazer um boletim nem sempre é fácil, e não é só ir lá e fazer, tem tudo o que vem junto, o kit do depois... É justamente esse depois eu imagino que muitas pessoas fogem a gente nunca sabe que consequência trará, algumas vezes é mais motivo para o agressor partir pra cima com força total, outras vezes parece que não surte nenhum efeito, é o medo da perseguição em muitos casos ele é imediata, o agressor já te coagiu dizendo: “se você entregar ele e ferrar com a vida dela, você está morta”... Essa é somente a minha percepção sem certo ou errado, é o que eu imagino que outras pessoas também sentem. Medo.

Passei dias me julgando silenciosamente, questionando, e se eu tivesse feito, o que teria acontecido, eu nunca vou saber. O sentimento de solidão é gigante, nunca me senti tão sozinha no mundo.

Imagino o quanto é difícil pra alguém ir lá e dar a cara à tapa numa delegacia, dizer que sofre agressão verbal e física da pessoa que está morando sob o mesmo teto, de um amigo, namorado ou de um vizinho.

Inclusive as ameaças: “se você me entregar, eu mato você e toda a sua família”, talvez por esse e outros motivos, muitas pessoas sofrem sozinhas e inclusive perdem a sua vida, não porque eram coniventes, ou aceitavam, elas não tinham saídas. Muitas vezes a gente acredita que o outro vai mudar e não muda.

Inclusive para se questionar porque se permitiram deixar tudo isso acontecer, falo mais sobre isso, porque muitas vezes fazendo mal mantemos relacionamentos ruins e tóxicos em outros textos abaixo:









Também é muito difícil ver amigos, pessoas desconhecidas ou pacientes contando suas histórias tristes e duras, sobre relacionamentos ruins, que só fizeram mal e essas pessoas não conseguiram seguir em frente e se defender. Muitas vezes as pessoas não conseguem sair dessa situação, é bem diferente, até querem, mas não conseguem.

São muitos os motivos que leva uma pessoa a não denunciar o agressor, é uma situação tão complicada, que nos deixam fragilizados e amarrados sem cordas. Não julgo, não culpo, só conseguimos fazer o que podemos com o que temos diante dessas situações, muitas vezes falta apoio das pessoas que a gente mais acredita que vai nos apoiar e não vem esse apoio.
É um beco da solidão, tipo uma criança indefesa, incapaz de proteger a si mesma.


Apesar das consequências, fuja dessa situação, mesmo que você não vá à delegacia porque ainda não está forte o suficiente pra isso, busque ajuda, talvez uma assistente social, um amigo sério que esteja de fato contigo disposto a ajudar e não fazer críticas, faça psicoterapia para que você possa encontrar uma luz no final do túnel e recomeçar a sua vida.

Agradeço a todas as pessoas que me defenderam no facebook, que me mandaram mensagens de apoio no whatsapp, a todos que falaram comigo e me ouviram, apontando saídas.

Muitas mulheres abusadas inclusive por pessoas próximas não conseguem falar sobre o assunto e muitas vezes quando falam para os parentes eles fingem que não vê. O buraco é bem mais embaixo e fundo... Não é falta de coragem, tampouco gostar de sofrer.

Esse foi o texto mais difícil de escrever, em todos os sentindos, embora eu ame escrever e faço isso já tem muitos anos, foi relembrar tudo o que eu vivi, foi sentir as mesmas sensações e emoções. Nunca julgue alguém por denunciar ou não um agressor, só ele pode saber a dor que sente. Não é covardia!

Se esse texto foi útil para você ou se você imagina que pode ser útil para outras pessoas, compartilhe!

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Gratidão
Beijocas
ઇઉ Sissa Geller|Silvana Souza de Sá
Psicóloga|CRP 06/90506

  


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